O prazo de 60 dias, estabelecido na Portaria nº 299 do Ministério da Justiça e Segurança Pública para o cadastro das armas de fogo de uso permitido e de uso restrito, adquiridas após a edição do decreto 9.785, de 7 de maio de 2019 no Sistema Nacional de Armas (Sinarm), que é gerido pela Polícia Federal, se encerrará no dia 1º de abril de 2023 e a pergunta que fica é: você vai ou não cadastrar as suas armas?
Este artigo não tem o objetivo de interferir em sua escolha que é estritamente pessoal, mas sim, apresentar argumentos que possam auxiliar em sua decisão.
Primeiramente, vamos entender qual é o objetivo da Portaria nº 299. Vajamos o que diz a descrição da mesma:
Dispõe sobre o cadastro de armas no Sistema Nacional de Armas – Sinarm, nos termos do Decreto nº 11.366, de 1º de janeiro de 2023.
Como está sendo realizado o cadastro?
O artigo 1º desta portaria destaca que o cadastro está sendo realizado por meio eletrônico disponibilizado pela Polícia Federal. Para aqueles que ainda não cadastraram suas armas e assim desejam, o meio eletrônico que diz o texto é o RECAD PF. Vajamos o que diz o artigo 1º:
Art. 1º A partir de 1º de fevereiro de 2023, todas as armas de uso permitido e de uso restrito após a edição do Decreto nº 9.785, de 7 de maio de 2019, serão cadastradas no Sistema Nacional de Armas – Sinarm, em meio eletrônico disponibilizado pela Polícia Federal, ainda que já registradas em outros sistemas, nos termos do art. 2º do Decreto nº 11.366, de 1º de janeiro de 2023.
Quem tem arma registrada no Sinarm terá que cadastrar novamente estas armas?
O parágrafo único do artigo 1º responde a esta questão. Vamos ao texto:
Parágrafo único. A obrigatoriedade constante do caput não se aplica às armas já cadastradas no Sinarm.
O artigo 3º da Portaria nº 299 estabelece o prazo de 60 dias para o cadastro das armas citadas na introdução do texto por meio do sistema eletrônico (RECAD PF) criado pela Polícia Federal para tal finalidade. Vejamos o que diz o artigo citado:
Art. 3º O cadastramento das armas deverá ocorrer, em até 60 (sessenta) dias, contados de 1º de fevereiro de 2023, da seguinte maneira:
I – as armas de uso permitido: serão cadastradas em sistema informatizado disponibilizado pela Polícia Federal; e
II – as armas de uso restrito: serão cadastradas em sistema informatizado disponibilizado pela Polícia Federal, devendo também ser apresentadas pelo proprietário mediante prévio agendamento junto às delegacias da Polícia Federal, acompanhada de comprovação do respectivo registro no SIGMA.
Parágrafo único. As armas de uso restrito pertencentes a colecionadores, atiradores e caçadores, para cumprimento do disposto no inciso II do caput deste artigo, deverão estar acompanhadas de guia de tráfego expedida pelo Comando do Exército, nos termos do art. 24 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003.
O artigo 4º da respectiva portaria, ameaça de prisão por posse ou porte ilegal de armas aqueles que possuem armas de fogo e que por algum motivo, não irão realizar o cadastramento. Confira:
Art. 4º O não cadastramento das armas na forma desta Portaria sujeitará o proprietário à apreensão do respectivo armamento por infração administrativa, sem prejuízo de apuração de responsabilidade pelo cometimento dos ilícitos previstos nos arts. 12, 14 e 16 da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, conforme o caso.
Após uma breve apresentação dos principais pontos da Portaria nº 299, perguntamos novamente: você vai ou não cadastrar as suas armas?
Possível solução
Uma possível solução para resolver de vez este problema (Portaria nº 299) seria o Congresso Nacional pautar os Projetos de Decretos Legislativos (PDLs) que existem na Câmara dos Deputados e Senado Federal com esta finalidade e derrubar esta arbitrariedade.
Para que isto aconteça, deve ter vontade política dos presidentes das duas Casas para colocarem os PDLs em votação, e ter votos favoráveis a esta derrubada.
Com o fim do prazo para o cadastro destas armas no Sinarm se aproximando, é pouco provável que isto aconteça. Temos um exemplo recente que podemos citar.
Em 2019, o Senado Federal derrubou o decreto 9.785 no dia 18 de junho. O mesmo havia sido publicado pelo governo federal à época no dia 7 de maio. Mesmo sendo sustado no Senado, o referido decreto (9.785/2019), também deveria ser pautado e derrubado na Câmara dos Deputados. Claro que para isto acontecer, levaria mais tempo, mas o governo federal se antecipou e revogou o decreto retirando do Congresso o objeto da ação.
Se o Congresso Nacional tivesse os presidentes da Câmara dos Deputados e Senado Federal favoráveis a derrubada da Portaria e também os votos dos deputados e senadores, a situação poderia ser outra, mas este não é o caso. A realidade é outra.
Análise
Primeiramente, deve ficar claro que este cadastro de armas de fogo no sistema gerido pela Polícia Federal é ilegal pois estas armas já estão cadastradas no Sistema de Gerenciamento Militar de Armas (SIGMA). Existe uma lei que regulamenta a questão e este recadastramento não pode ser exigido por decreto e portaria.
A lei em questão é a 10.826/03, conhecida como Estatudo do Desarmamento. Existem dois pontos nesta lei que deixam claro que estas armas devem ser cadastradas exclusivamente no sistema gerido pelo Exército Brasileiro. Vejamos:
Lei 10.826/03
Art. 2.
Parágrafo único. As disposições deste artigo não alcançam as armas de fogo das Forças Armadas e Auxiliares, bem como as demais que constem dos seus registros próprios.
Lei 10.826/03
Art.24 Excetuadas as atribuições a que se refere o art. 2º desta Lei, compete ao Comando do Exército autorizar e fiscalizar a produção, exportação, importação, desembaraço alfandegário e o comércio de armas de fogo e demais produtos controlados, inclusive o registro e o porte de trânsito de arma de fogo de colecionadores, atiradores e caçadores.
Como verificado, a Lei 10.826/03 já estabelece a forma e o local onde estas armas de fogo devem ser cadastradas e a própria lei deixa claro a ilegalidade da mencionada portaria.
Devo cadastrar minha armas no Sinarm?
Cada pessoa deve fazer uma análise e responder esta pergunta. Você já fez o cadastro destas armas quando as adquiriu e o Estado já sabe onde elas se encontram. Então, a questão deve ser encarada por todos com seriedade que merece para minimizar os impactos.
Não devo cadastrar minhas armas?
Talvez seja exatamente este o objetivo do atual governo federal. Já é pública as declarações do atual presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em favor do desarmamento no país. Aliás, foi o próprio Lula quem sancionou a Lei 10.826/03 (Estatuto do Desarmamento).
O atual governo federal pode estar esperando o final do cadastramento (1º de abril de 2023) para saber a quantidade de pessoas que não vai realizar o cadastro, para então, tentar legitimar junto a imprensa, sociedade e judiciário, possíveis buscas e apreensões destes equipamentos e, por consequência, realizar diversas prisões destes proprietários de armas de fogo.
Por fim, fica a reflexão se vale a pena correr o risco de não cadastrar suas armas e poder ser preso futuramente por posse e/ou porte ilegal de arma de fogo, mesmo tudo estando correto perante a lei. Como já dissemos, o Estado já sabe onde estão as suas armas, ele pode estar querendo passar um “verniz” de legalidade na arbitrariedade que está cometendo.